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Grupo da USP celebra 20 anos de pesquisas sobre a construção social da paisagem

Fundado em 2003 na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP, o Núcleo de Estudos da Paisagem (NEP) nasceu com a missão de explorar a paisagem como uma construção social e partilha de experiências, tendo a cidade, a natureza e a cultura como objetos de investigação. Reunindo uma ampla diversidade de pesquisadores provenientes de várias áreas, o núcleo se destaca por suas pesquisas integradas. O objetivo é explorar, por meio de práticas colaborativas e estudos da história da cultura, os modos de produção e apropriação do espaço.

De acordo com Euler Sandeville, professor da FAU responsável pela criação do grupo, o surgimento do NEP aconteceu após a sua passagem por Jequitinhonha, município de Minas Gerais, onde conversou com pessoas que compartilharam suas experiências com a paisagem. Foi assim que ele confirmou sua ideia de que a paisagem é uma partilha a partir da vivência de cada um. “Nessa viagem, conversando com as pessoas, eu percebi o quão rico é o diálogo para a construção do conhecimento. O conhecimento é renovado a partir da experiência com outras pessoas”, destaca.

Como informa o professor, a abordagem se concentra em entender a realidade local de cada região e estabelecer conexões com os sistemas ambientais e a estrutura urbana. “A partir da identificação de seus problemas, o projeto busca propor e construir soluções estratégicas e de monitoramento das condições básicas da qualidade de vida e das paisagens”, comenta.

As ações colaborativas acontecem em parceria com escolas, coletivos, grupos de ação social e instituições públicas, explica Sandeville. O NEP busca estabelecer uma abordagem participativa, reconhecendo o direito fundamental das populações serem informadas sobre a natureza e os procedimentos das atividades desenvolvidas em suas regiões, ressalta. Para ele, esse aspecto fortalece a participação ativa das comunidades no planejamento e na gestão dos espaços em que vivem.

As linhas de pesquisa do NEP são baseadas na Espiral da Sensibilidade e do Conhecimento — um conceito criado pelo professor Sandeville —, que valoriza os princípios éticos e solidários na construção de valores, o diálogo crítico e respeitoso entre as diferenças e os esforços para a construção de relações sociais mais íntegras, justas e afetuosas. Segundo o professor, é preciso “existir uma forma de produção de conhecimento que não exclua a sensibilidade” e os princípios da espiral permitem que isso aconteça.

Os projetos do NEP

Entre os projetos do núcleo se destacam ações em três regiões de São Paulo: Heliópolis, Brasilândia e Atibaia. Em 2007, por exemplo, o projeto em Atibaia mobilizou alunos de pós-graduação e parceiros externos, em colaboração com duas outras unidades da USP, para a preservação da Pedra Grande, monumento natural do município.

O trabalho colaborativo do NEP resultou em intensa mobilização social local e contribuiu para uma série de ações do Ministério Público e da Prefeitura de Atibaia. “Isso desencadeou um processo de preservação que contribuiu para a inclusão da Pedra Grande no Mosaico de Unidades Conservação (UC) da Região Metropolitana de São Paulo”, ressalta o professor.

Em 2009, por meio da implementação de uma disciplina colaborativa em Heliópolis, localizado no distrito de Sacomã, na zona sul da cidade de São Paulo, o NEP realizou um projeto que tinha como objetivo exercitar a percepção da paisagem e o processo artístico criativo de alunos, moradores e artistas independentes da região. De acordo com Sandeville, a criação da disciplina era aberta não só para alunos da FAU como também para coletivos.

A proposta mobilizou uma série de reuniões e atividades pela cidade e, entre elas, estava uma oficina artística com as crianças e adolescentes da região, em que eles tiveram que demonstrar, por meio desenhos, modelos e maquetes, sua percepção sobre o local onde moram e, em uma escala maior, sobre Heliópolis.

Ações atuais

Atualmente, o NEP prioriza o desenvolvimento de projetos nos distritos de Perus, Anhanguera e Jaraguá. O programa está concentrado principalmente em ações colaborativas com escolas públicas da região, tendo como foco o desenvolvimento de processos de interpretação da paisagem natural e urbana, além de contribuir para a formação de professores nesse tema específico. Sandeville afirma que “a cooperação com as escolas tem sido uma tônica importante para o trabalho do núcleo”.

O núcleo de pesquisa também está desenvolvendo estudos sobre a fronteira oeste do Estado de São Paulo em relação a seus Estados vizinhos. “Estamos começando uma grande aproximação com a região Centro-Oeste. Isso é importante porque a maioria dos projetos costuma estar muito centrado nas áreas metropolitanas, sobretudo na área metropolitana de São Paulo”, explica o professor.

Entre os projetos em andamento, Sandeville destaca a parceria entre o NEP e a escola Emef Profª Philó Gonçalves dos Santos, localizada no distrito de Perus, para a criação de uma ecopraça. O NEP lançou uma disciplina optativa na FAU chamada Projeto de Praça Urbana, na qual trabalharam na elaboração do projeto de arquitetura de maneira colaborativa, envolvendo tanto os estudantes quanto os professores da FAU e da escola. O projeto final da praça foi apresentado em agosto de 2022 e uma disciplina de extensão dará continuidade ao trabalho.

O projeto tem como objetivo transformar uma área não utilizada de mais de 14 mil metros quadrados, localizada atrás da escola, em um espaço verde. A proposta visa a promover a acessibilidade e a criação de espaços recreativos integrados de forma didática. As áreas planejadas para a ecopraça incluem três quadras, parque, pista de skate, jardim de chuva, anfiteatro, árvores urbanas e frutíferas, parede de escalada, relógio solar, horta pedagógica, composteira, entre outros.

De acordo com Sandeville, as equipes das duas instituições elaboraram uma estratégia e um cronograma, realizando um trabalho colaborativo de adaptação. Essa colaboração foi essencial para o desenvolvimento da iniciativa. O projeto Ecopraça Philó também tem o objetivo de resgatar a herança cultural e histórica do local, servindo como um ponto de resistência e transformação social.

Como participar do NEP?

É possível participar do NEP como pesquisador mediante projeto de pesquisa, em nível de iniciação científica, mestrado, doutorado e pós-doutorado. O projeto também abre a possibilidade de um programa de treinamento para a formação de pesquisadores populares.

Os orientandos de iniciação científica e cursos de extensão devem ser alunos da USP ou solicitantes via agências de fomento, como a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Para mestrandos e doutorandos, o ingresso é mediante edital e as informações devem ser obtidas no ano correspondente ao processo seletivo junto à Secretaria de Pós-Graduação. Já para os pós-doutorandos, é necessário consultar as normas da Secretaria e elaborar um projeto de pesquisa com o acompanhamento de um professor orientador.

Entretanto, todos os interessados podem participar do grupo de estudos do NEP, basta verificar a agenda de reuniões e entrar em contato com o núcleo por meio de formulário neste link. Dentro de um limite de vagas, todos os interessados — internos e externos à USP — também podem participar das disciplinas que integram o núcleo de pesquisa.